Pesquisa sobre o enfrentamento à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes no Brasil
A “Pesquisa sobre o enfrentamento à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes no Brasil” é fruto de uma parceria entre a Universidade de Nottingham, na Inglaterra, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), situada no estado de Pernambuco, e a The Freedom Fund, com financiamento da UK Research and Innovation (UKRI), e o apoio administrativo da Fade-UFPE. A pesquisa foi coordenada pela Profa. Dra. Valeria Nepomuceno (UFPE) e pelo Prof. Dr. Ben Brewster, da Universidade de Nottingham.
O trabalho teve como objetivo geral analisar as configurações da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes no Brasil, mais especificamente no estado de Pernambuco, e as experiências de sobreviventes para a construção das políticas públicas de enfrentamento. Como objetivos específicos, são apontados os seguintes: 1) Examinar a rápida mudança da exploração sexual de crianças e adolescentes (ESCCA) no Brasil/ Pernambuco – incluindo modalidades de perpetração – e seu impacto para os/as sobreviventes; 2) Identificar desafios à implementação das políticas públicas de enfrentamento à ESCCA, perante as mudanças no processo da exploração sexual e na conjuntura nacional; 3) Analisar o marco legal nacional sobre crimes sexuais e as normativas de políticas públicas de enfrentamento ao fenômeno da ESCCA, produzindo-se recomendações.
Para alcançar as metas, foram utilizadas diferentes metodologias em pesquisas de cunho qualitativo, contendo quatro eixos de dados: 1) Entrevistas de inspiração narrativas com 20 adolescentes (sobreviventes de ESCCA e outros considerados em risco de ESCCA); 2) Entrevistas semiestruturadas com 10 informantes-chave (especialistas, atuantes nas áreas da Assistência Social, Educação, Justiça, Saúde e Segurança, do Governo ou da Sociedade Civil); 3) Dados de nível individual, registrados rotineiramente, de organizações parceiras em nível local, dados oficiais de âmbito nacional e estadual; 4) Revisão da literatura existente, dos dados legais e de políticas públicas de enfrentamento à ESCCA.
A pesquisa com os/as adolescentes reuniu 20 entrevistas e anotações realizadas nas idas ao campo, analisando, entre outros fatores, os impactos do serviço de instituições governamentais e não governamentais nas suas vidas. Na avaliação dos/as adolescentes foram apontados aspectos negativos e positivos. Como elementos positivos, são apresentados os seguintes: 1) A escuta, o acolhimento e a partilha podem fazer diferença na vida desses/dessas adolescentes; 2) Importância de ações capazes de mitigar a insegurança alimentar; 3) Transformação de vida que a efetivação de serviços pode causar; e 4) Conscientização de que a formação e o acesso ao saber e aos direitos são fatores producentes. Entre os elementos avaliados como negativos, destacam-se: 1) Desinformação ou não acesso à informação, que gera medo, fantasias e inseguranças; 2) Violência em diferentes dimensões; 3) Falta de infraestrutura nos serviços; 4) Não acesso aos direitos, por meio de uma escuta que desconsidera as especificidades de gênero, geração e letramento e permite a manutenção de estigmas sociais.
Nas entrevistas com os 10 especialistas, destacou-se o debate sobre o Estado e o enfrentamento à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes no Brasil. A atuação do Estado foi identificada como reduzida e insuficiente para o devido enfrentamento do crime da ESCCA, tendo se tornado mínima para as políticas sociais públicas, que se apresentam fragmentadas, desarticuladas, descontinuadas e ineficientes, e sofrendo com a escassez de recursos financeiros, de pessoal e de dados.
Além das entrevistas, foi realizada a pesquisa de dados e informações, priorizando o período de 2019 a 2022, nos registros nacionais e de Pernambuco. Foram analisados os marcos legais e normativos de políticas públicas relacionados ao tema da ESCCA.
Durante o desenvolvimento do trabalho, criou-se 4 briefings: “O impacto da pandemia da Covid-19 nas crianças e adolescentes no Brasil”; “O desenvolvimento de planos de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes”; “Pesquisa sobre o enfrentamento à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes no brasil: recomendações de ação“; e “A exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes e as experiências de atendimento nos serviços de apoio”. Os documentos foram produzidos conjuntamente pela equipe da UFPE, da Universidade de Nottingham e The Freedom Fund.
Este projeto influenciou os processos de reformulação de três instrumentos de políticas públicas estratégicas nos níveis estadual e nacional (Planos Nacional e Estadual de Pernambuco de Enfrentamento à Violência Sexual contra a Criança e Adolescente e o Plano Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil), a fim de garantir que abordem, de forma adequada, demandas urgentes e considerem as opiniões dos/as adolescentes.
Por fim, realizaram-se dois workshops, gerando o engajamento das instituições presentes com o enfrentamento à ESCCA. Os resultados parciais e finais da pesquisa foram discutidos com as instituições governamentais e não governamentais presentes nos eventos, proporcionando a troca de conhecimento para informar as respostas a esse enfrentamento de forma mais ampla, dentro e fora do país.
O legado da pesquisa tem sido sustentado por meio de atividades de disseminação, visando a inclusão dos resultados do trabalho nos principais órgãos de formulação de políticas no Brasil e no estado de Pernambuco. A equipe do projeto contribuiu nas audiências públicas, consultas, reuniões e seminários, promovidos por diferentes órgãos. A partir das recomendações da pesquisa, foram elaboradas propostas para o orçamento público de Pernambuco, apresentadas para a Assembleia Legislativa de Pernambuco (ALEPE). No dia 10 de maio de 2024 será lançado um livro com artigos inspirados nas principais reflexões resultantes da pesquisa. O interesse na pesquisa aponta a sua relevância e também que ela atingiu plenamente os seus objetivos.